terça-feira, 4 de dezembro de 2012

ECA - DA PRÁTICA DE ATO INFRACIONAL



Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.


Dado que os menores de 18 anos são inimputáveis perante a CF, artigo 228, bem como ao Código Penal, art, 27, não há se falar em crimes ou contravenções.

Assim, toda conduta que se enquadre daquela forma será denominada ato infrancional, quando o sujeito ativo for criança ou adolescente. Dessa forma, a responsabilização é socioeducativa ou estatutária e não penal.


Por outro lado, o sujeito ativo do ato infracional é sempre o adolescente, visto que a criança fica adstrita apenas às medidas de proteção descritas no art. 101.

Súmula 338: “A prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativa”.

Ainda, deverá ser observado o devido processo legal nos processos atinentes a atos infrancionais.

Claro é o entendimento que deve ser observada a natureza pedagógica das medidas aplicáveis a adolescentes.


    Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.

    Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.

Embora inimputável, o adolescente é responsável por seus atos, dentro da sua condição especial de pessoa em desenvolvimento.


    Art. 105. Ao ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas previstas no art. 101.

Quando a criança se vê envolvida em ato infracional, deverá ser encaminhada ao Conselho Tutelar, onde lhe será aplicada medida protetiva mais adequada (art. 101).

No direito penal a regra são penas privativas de liberdade, e, excepcionalmente, penas restritivas de direito, enquanto que no Estatuto,  a exceção é a medida de internação.


Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.
  
Parágrafo único. O adolescente tem direito à identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado acerca de seus direitos.


A condição de irregularidade recai hoje sobre a família, a sociedade e o Estado, não mais sobre a criança ou adolescente, como acontecia na doutrina da situação irregular, com base no revogado Código de Menores.

Deduz-se do presente artigo as seguintes garantias:

- princípio da presunção de inocência;

- direito de ser informado de seus direitos;

- direito ao devido processo legal.

- a fundamentação decorre da segunça jurídica, ou seja, as partes devem saber os motivos de convencimento em face da decisão judicial.

O remédio contra a ilegalidade é o Habeas Corpus, cabível quando alguém sofrer ou estar na iminência de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção. (art 5º, LXVIII, CF).


    Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local onde se encontra recolhido serão incontinenti comunicados à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada.

    Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata.

A inobservância do presente artigo, por parte da autoridade responsável,  caracteriza o tipo penal descrito no art. 231 do Estatuto, crime próprio, pois o sujeito ativo é a autoridade policial.



    Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias.

    Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada e basear-se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.

Atentar para o art. 174, o qual trata da soltura imediata do adolescente, diante do comparecimento dos pais ou responsável, salvo rara exceção, quando o ato infracional for de grande repercussão social.

Jurisprudência:

Habeas Corpus. Decorrido o prazo de 45 dias, e não havendo fato relevante para superação desse prazo, cabe Habeas Corpus para reparar constrangimento ilegal. Ordem concedida. TJDF, HC 127879.
Os prazos do Estatuto são sempre imperativos, não admitindo prorrogações. Cabe sempre a participação do MP, pois trata-se de interesses difusos e indisponíveis, tutelados pelo Estado. Ainda, a titularidade de ação penal pública é exclusiva do MP.


    Art. 109. O adolescente civilmente identificado não será submetido a identificação compulsória pelos órgãos policiais, de proteção e judiciais, salvo para efeito de confrontação, havendo dúvida fundada.



    Art. 110. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido processo legal.


    Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, as seguintes garantias:

    I - pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante citação ou meio equivalente;

    II - igualdade na relação processual, podendo confrontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as provas necessárias à sua defesa;

    III - defesa técnica por advogado;

    IV - assistência judiciária gratuita e integral aos necessitados, na forma da lei;

    V - direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente;

    VI - direito de solicitar a presença de seus pais ou responsável em qualquer fase do procedimento.




“O rol de garantias do art. 111 não é exaustivo”, basta observar a expressão “entre outras” no caput do dispositivo.

“O inciso III estabelece a obrigatoriedade da presença de procurador aos adolescente”. O Código de Menores apenas considerava essa situação facultativa.

A não interferência de advogado, assim como sua deficiência expressiva, poderá ensejar a anulação do processo.

Assim, “a ausência de advogado é causa de nulidade absoluta do processo”. Para tanto, observar a Súmula 523 do STF. Seria o caso de Defensor Público, ou,  na sua falta, advogado nomeado pelo juiz.



    Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

    I - advertência;

    II - obrigação de reparar o dano;

    III - prestação de serviços à comunidade;

    IV - liberdade assistida; (mínimo de seis meses)

    V - inserção em regime de semiliberdade;

    VI - internação em estabelecimento educacional;

    VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

    § 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.

    § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.

    § 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.

Bom esclarecer que as medidas têm cunho educativo, não punitivo.

A autoridade competente para aplicar tais medidas é o magistrado, conforme artigo 148, I, ou, na hipótese de remissão, o representante do MP, nos incisos I a IV e VII, arts. 126 a 128.



    Art. 113. Aplica-se a este Capítulo o disposto nos arts. 99 e 100.

Dar prioridade ao  enfoque pedagógico das mediadas.



    Art. 114. A imposição das medidas previstas nos incisos II a VI do art. 112 pressupõe a existência de provas suficientes da autoria e da materialidade da infração, ressalvada a hipótese de remissão, nos termos do art. 127.

    Parágrafo único. A advertência poderá ser aplicada sempre que houver prova da materialidade e indícios suficientes da autoria.

Observa-se que o inciso I, advertência, não pressupõe provas suficientes da autoria e da materialidade, porém,  não significa que cabe tal medida em mera suspeita.


    Art. 115. A advertência consistirá em admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada.

Dirigida ao adolescente autor da infração,  aplicada pelo magistrado, na presença dos pais ou responsável.

Há controvérsias, quanto à formação ou não de processo, e, em consequência, do contraditório.


    Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima.

    Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.

O artigo além de educativo trata da reparação do dano.

O Código Civil, em seu artigo 932, I, determina que os pais são responsáveis pela reparação patrimonial.

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;


    Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.

    Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a freqüência à escola ou à jornada normal de trabalho.

Considera-se que a medida é opcional por parte do adolescente,  tendo em vista que não é permitido o trabalho forçado, em qualquer hipótese, conforme §2º do artigo 112 e artigo 5º, inciso XLVII, alínea ‘c’, da CF.

“O trabalho será prestado gratuitamente, com acompanhamento da autoridade judiciária, o que se efetivará por meio de relatórios, os quais a entidade beneficiada se obriga a emitir periodicamente”.

Importante:

Poderá adolescente com idade inferior a 14 anos cumprir medida socioeducativa, prestação de serviços à comunidade (PSC)?
Os tribunais entendem que podem, haja vista que não se trata de vínculo empregado e empregador, mas medida de caráter educativo, conforme julgado abaixo:

Jurisprudência:

Ato infracional: Aplicação de medida socioeducativa de prestação de seviços à comunidade, (...) poderá ser aplicada ao adolescente (pessoa entre 12 e 18 anos) que pratica ato infracional, como é o caso em análise. (TJSC, Apelação nº 2003. 002142-6, julgado em 1-4-2003).


    Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.

    § 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.

    § 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.

A liberdade assistida difere da liberdade vigiada. Esta busca apenas o controle sobre os atos do adolescente, aquele atua como um meio de proteção, fortalecendo os vínculos com a família e a comunidade.

A liberdade assistida é menos uma sanção penal e mais uma medida pedagógica. Terá o adolescente um acompanhamento por orientador designado pelo juiz.



    Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:

    I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social;

    II - supervisionar a freqüência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula;

    III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho;

    IV - apresentar relatório do caso.

Sobre esse relatório, quanto mais minucioso, melhor.

“A liberdade assistida será aplicada diante da prática reiterada de atos infracionais leves ou nas hipóteses em que, embora tenha sido praticado ato grave, o contexto social e o comportamento do adolescente recomendam não seja afastado de usa família e da sua comunidade”. (Elias, 2004, p.95).



    Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial.

    § 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade.

    § 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação.

No regime de semiliberdade, o adolescente recolhe-se à noite a um estabelecimento. Durante o dia estará livre para realizar atividades externas: frequentar escolas e trabalhar, conforme artigo 120, parágrafo primeiro. Para tanto não depende de autorização judicial.

Segundo Silva (1995, p. 185), a semiliberdade corresponde à semi-internação.

Entende-se que a semiliberdade é um relaxamento do regime de internação, e uma preparação para a liberdade assistida.

Quanto aos prazos, em face do § segundo do artigo 120: prazo indeterminado, reavaliação a cada 6 meses, prazo máximo de 3 anos, liberação compulsória aos 21 anos.


    Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

    § 1º Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.

    § 2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses.
    § 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.

    § 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida.

    § 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.

    § 6º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público.

    § 7o  A determinação judicial mencionada no § 1o poderá ser revista a qualquer tempo pela autoridade judiciária.      

Indispensável é o devido processo legal para medidas privativas de liberdade, conforme artigos 171 a 190 do Estatuto.


    Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:

    I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;

    II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves;

    III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.

       § 1o  O prazo de internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá ser superior a 3 (três) meses, devendo ser decretada judicialmente após o devido processo legal.     

    § 2º. Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada.

A medida de internação é cabível somente nos casos de violência à pessoa ou grave ameaça, reiteração de outras infrações graves ou mediante descumprimento de medida anteriormente imposta.



Art. 123. A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração.

    Parágrafo único. Durante o período de internação, inclusive provisória, serão obrigatórias atividades pedagógicas.

A expressão “abrigo” se refere ao acolhimento institucional. A intenção é separar o adolescente em conflito com a lei daquele acolhido institucionalmente.


    Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes:

    I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do Ministério Público;

    II - peticionar diretamente a qualquer autoridade;

    III - avistar-se reservadamente com seu defensor;

    IV - ser informado de sua situação processual, sempre que solicitada;

    V - ser tratado com respeito e dignidade;

    VI - permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável;

    VII - receber visitas, ao menos, semanalmente;

    VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos;

    IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal;

    X - habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade;
    XI - receber escolarização e profissionalização;

    XII - realizar atividades culturais, esportivas e de lazer:

    XIII - ter acesso aos meios de comunicação social;

    XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim o deseje;

    XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura depositados em poder da entidade;

    XVI - receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade.

    § 1º Em nenhum caso haverá incomunicabilidade.

    § 2º A autoridade judiciária poderá suspender temporariamente a visita, inclusive de pais ou responsável, se existirem motivos sérios e fundados de sua prejudicialidade aos interesses do adolescente.

O rol de direitos acima elencados não é taxativo, de sorte que os demais direitos constantes da Lei 8.069/90 devem, por óbvio, ser respeitados.


    Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e segurança.

Para o descumprimento do artigo em foco cabe Ação Civil Pública de competência do MP, assim como ação de indenização em favor do adolescente lesado ou sua família.


    Art. 126. Antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do Ministério Público poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e conseqüências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional.

    Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo.

A remissão nada mais é do que o perdão em face da menor participação do adolescente no ato infracional.

Assim, temos duas formas de remissão: a oferecida pelo MP (caput), antes de iniciado o processo, e a judicial (parágrafo único), determinada pelo magistrado, após iniciado o processo.


    Art. 127. A remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semiliberdade e a internação.

O processo extinto pela remissão não deverá ser considerado para aplicação de medida posterior, ainda que tenha sido cumulada com medida socioeducativa.

    Art. 128. A medida aplicada por força da remissão poderá ser revista judicialmente, a qualquer tempo, mediante pedido expresso do adolescente ou de seu representante legal, ou do Ministério Público.

O artigo abre a possibilidade da revisão judicial da medida aplicada no momento da remissão.